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O Espinheiro Eclesiástico

29 de abril de 2014

Reencontrei hoje esta parábola no Antigo Testamento:

Certo dia as árvores saíram para ungir um rei para si. Disseram à oliveira: ‘Seja o nosso rei!’. “A oliveira, porém, respondeu: ‘Deveria eu renunciar ao meu azeite, com o qual se presta honra aos deuses e aos homens, para dominar sobre as árvores?’ “Então as árvores disseram à figueira: ‘Venha ser o nosso rei!’ “A figueira, porém, respondeu: ‘Deveria eu renunciar ao meu fruto saboroso e doce, para dominar sobre as árvores?’ “Depois as árvores disseram à videira: ‘Venha ser o nosso rei!’ “A videira, porém, respondeu: ‘Deveria eu renunciar ao meu vinho, que alegra os deuses e os homens, para ter domínio sobre as árvores?’ “Finalmente todas as árvores disseram ao espinheiro: ‘Venha ser o nosso rei!’ “O espinheiro disse às árvores: ‘Se querem realmente ungir-me rei sobre vocês, venham abrigar-se à minha sombra;” (Juízes 9:7-15).

Interessante como somente o espinheiro, árvore infrutífera, aceitou reinar sobre as demais. Agora compare isso com o que o Senhor tem a nos dizer abaixo:

Vocês sabem que os governantes das nações AS DOMINAM, e as pessoas importantes EXERCEM PODER sobre elas. NÃO SERÁ ASSIM ENTRE VOCÊS; ao contrário, quem quiser tornar-se importante entre vocês deverá ser servo, e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo, como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por muitos. (Mat. 20:25-28)

…Os reis das nações DOMINAM sobre elas, e os que EXERCEM AUTORIDADE sobre elas são chamados de benfeitores; MAS VOCÊS NÃO SERÃO ASSIM. Ao contrário, o maior entre vocês deverá ser como o mais jovem, e aquele que governa como o que serve. Pois quem é maior, o que está à mesa, ou o que serve? Não é o que está à mesa? Mas eu estou entre vocês como o que serve. (Luc. 22:25-27).

O modelo atual de liderança eclesiástica, com suas patentes e hierarquias, parece ser nada mais do que um grande espinheiro.

Ecce Homo

25 de abril de 2014

Ecce Homo

Alguém se lembra desse incidente (ou poderíamos dizer “acidente”)? Aconteceu no ano passado, em meados de agosto. A pintura se chama(va) Ecce Homo (Eis o Homem) de Elias Garcia Martinez. Por mais de um século, a pintura foi o orgulho da Igreja Santuário da Misericórdia nas proximidades de Zaragoza, Espanha. Com o tempo, a pintura se desgastou por causa da umidade nas paredes da basílica e Cecilia Giménez, uma fiel de 80 anos de idade, resolveu dar uma ajudinha na restauração. O resultado final é o “Homem Elefante” que vocês estão vendo na foto.

Analisando a História da Igreja – incluindo os capítulos que estamos escrevendo hoje – constato com tristeza que este é o nosso cliclo vicioso. Percebemos que há algo errado na imagem de Cristo na terra – que é a sua Igreja. Tentamos restaurar algo que se perdeu e as vezes os resultados são catastróficos. Tudo porque nos falta habilidade para traçar as linhas, combinar as cores de maneira eficiente, e a sensibilidade para saber quando pressionar o pincel e quando escorregá-lo de forma mais leve sobre a lona.

Por alguma razão, custa-nos encontrar um ponto de equilíbrio enquanto “pintamos”. Muitos de nós vemos o desgaste na “pintura”, queremos mudança, queremos melhora, mas tudo o que conseguimos fazer às vezes é deformar ainda mais a imagem de Cristo. Nos dias de hoje, saímos do extremo do institucionalismo e caímos no outro extremo da informalidade, da “igreja” casual, das vãs conversas de Starbucks. Saímos do extremo de uma mensagem legalista que só prega o fogo do inferno aos pecadores, para cair no extremo do evangelho “água com açucar” de um deus hippie, um velho gagá “paz e amor”, que não confronta pecados ou prega arrependimento. Saímos do fundamentalismo bíblico literalista para cair no liberalismo teológico que mina nossa confiança na Palavra de Deus. Saímos do extremo da “carismanía”, dos retetés, dos modismos e exageros pentecostais, para cairmos no extremo do cessacionismo e seu intelectualismo estéril que nega o poder de Deus. Da salvação pelas obras, caímos no extremo da graça barata, e assim por diante. Sempre trafegando pelos extremos…

Sou otimista quanto aos tempos em que vivemos. Sou confiante no fato de que Deus, em sua divina soberania, avançará com os marcos da Reforma e providenciará um legado para as gerações posteriores. No entanto, não pelos méritos da carne e do sangue. Todos nós corremos o risco de, a exemplo desta octogenária, superestimar nossas habilidades, seja por nossa idade, seja por nossas experiências passadas, nosso intelecto, nosso conhecimento, pelo carisma que temos com as pessoas, ou pelos dons espirituais que possuímos. Todos corremos o risco de apertar o pincel demais ou afrouxá-lo demais, combinar as cores de maneira equivocada e criar traços toscos e inábeis que venham a estragar a pintura.

Que o Senhor nos ajude a caminhar em equilíbrio, no poder de nossa vulnerabilidade e dependência daquele que sabe pintar como ninguém mais.

Soli Deo Gloria.

© Pão & Vinho

Este texto está sob a licença de Creative Commons e pode ser republicado, parcialmente ou na íntegra, desde que o conteúdo não seja alterado e a fonte seja devidamente citada: http://paoevinho.org.

 

 

Reforma de Aquário

7 de abril de 2014

Àqueles que renunciam uma postura meramente defensiva com relação ao fenômeno dos “desigrejados”, este é um tempo único para uma reflexão e reavaliação de algumas de nossas práticas “igrejeiras”. Os mais sinceros conseguirão ver brechas nos odres atuais e reconhecerão a necessidade de odres novos. Mas ao invés de buscar odres novos, muitos tentarão remendar os odres atuais. De fato, já há uma tentativa de reforma nos dias de hoje. Alguns, no entanto, estão tentando canalizar isso dentro das instituições religiosas.

Por experiência própria posso dizer que certos princípios de grupos pequenos tornam uma congregação institucional mais dinâmica e viva. Mas mais cedo, ou mais tarde, tais comunidades terão que escolher entre preservar o vinho novo ou manter os odres velhos. E é aí que normalmente os problemas começam a acontecer.

Não posso afirmar que seja impossível uma Igreja institucionalizada se converter totalmente em uma igreja orgânica. No entanto, sou muito pouco otimista quanto a isso. Igrejas institucionais que possuem grupos pequenos normalmente seguem dois caminhos: ou cristalizam seus pequenos grupos em pequenos cultinhos, levando a tradição religiosa dos templos para dentro das casas na forma de uma rígida estrutura clero-laical e liturgica, ou na melhor das hipóteses se tornam congregações esquizofrênicas com o tempo.

Conforme a vida orgânica da Igreja se desenvolve, menos e menos os membros dependem dos aparatos institucionais para viver a Igreja, e os anticorpos da instituição começam a reagir. A instituição tem uma vida própria, e seu instinto de preservação é algo antagônico àquilo que um cristianismo orgânico propõe. E muitos, seja por dependência financeira ou emocional da tradição religiosa, servem como anticorpos institucionais ao mover do Espírito em suas fileiras.

Estas pessoas querem mudança, mas como ainda não estão preparadas para nadar nas correntezas do rio de Deus, preferem criar uma reforma de aquário, que possui características semelhantes ao real, mas que coloca limites e tenta manter o mover em um ambiente humanamente controlado pela tradição clerical-templocêntrica.

Entretanto, não há como dizer que estes movimentos não sejam válidos, pois despertam as pessoas para uma dimensão espiritual de sacerdócio universal e comunhão. Não há dúvida de que representa um progresso quando comparado ao modelo tradicional. Acredito que Deus está usando o movimento celular para despertar os sentidos adormecidos da Igreja. Entretanto, penso que o odre institucional é muito pequeno para conter o vinho novo que Deus quer derramar. E conforme os odres velhos começarem a rachar, crentes famintos crescerão espiritualmente como a borboleta que rompe com seu casulo para bater asas e voar – renunciando sua dependência do sistema religioso para permitir que seus instintos espirituais os levem rumo a uma Igreja mais orgânica. Mas isso envolverá renúncia e auto-sacrifício para nos ajustarmos aos padrões que Deus espera de nossa geração.

© Pão & Vinho

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Dominadores versus Passivos

7 de abril de 2014

Na questão dos grupos pequenos, há dois tipos de personalidades que merecem atenção especial. Os passivos e os dominadores.

Os passivos vêm com seus dons espirituais adormecidos e estão condicionados a assistirem a reunião somente, não participar. Eles esperam que alguém, um presbítero ou outro irmão “espiritual”, lhes dispense uma bênção (oração, Escritura, profecia), mas não vão às reuniões para ser parte do processo de intercâmbio de graça.

Já os dominadores são pessoas que tomam conta das reuniões por causa de seus dons, na maioria das vezes genuínos, mas que são usados incautamente de uma maneira que encobre ou sufoca os demais dons espirituais presentes no ajuntamento. São como músicos que tocam seus instrumentos fora de harmonia com o Maestro – vivem “bumbando na pausa” e estragando a sinfonia. Muitos “dominadores” são pessoas sinceras, que não se dão conta daquilo que estão fazendo. Já outros pensam que o fato de Deus constantemente lhes dar algo lhes dá o direito de se tornar o centro da reunião (como se mais ninguém recebesse nada de Deus).

Dominadores e passivos se completam como unha e carne em um sistema clero-laical, mas devem ser pastoreados para aprender a sair de seus extremos e serem uma benção no processo de Intercâmbio de Graça dos grupos caseiros.

© Pão & Vinho

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A Igreja Orgânica e o dom apostólico

7 de abril de 2014

Anos atrás, antes de “Igreja orgânica” virar moda, eu já escrevia no Fórum da Revista Impacto que no futuro (que agora já é presente) muitos grupos caseiros iriam surgir sem um direcionamento apostólico e acabariam se dissolvendo. Atualmente, os críticos do mover estão notando isso e estão usando esses modelos abortivos como munição, em sua defesa a favor do institucionalismo greco-romano (fora do qual “não há igreja”).

As comunidades orgânicas que estão surgindo precisam ser banhadas por um outro mover, que aparentemente ainda está em falta: um mover apostólico que levante irmãos e irmãs de mãos calejadas e com espírito quebrantado, munidos com revelação genuína do funcionamento do Corpo de Cristo, para dar ligamento às comunidades. De outra maneira, aquilo que começa como um mover espontâneo do Espírito acaba se institucionalizando na melhor das hipóteses, ou se desintegrando na pior delas.

Penso, no entanto, que há ramos verdes brotando e, apesar de algumas flores que morrem, a Primavera é inevitável se perseverarmos em intercessão. É a intercessão que refina nossa visão e nos colocar um passo à frente daquele que semeia o joio entre nós.

© Pão & Vinho

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Hereges

2 de abril de 2014

Historicamente falando, “herege” é todo aquele que desafia o status quo. Os “hereges” são as pessoas mais felizes, mais apaixonadas, mais vibrantes, mais comprometidas e dedicadas, irrestivelmente atraídas por um alvo inalcançavel ou invisível a outros.

“Hereges” são os mais crentes em uma geração de incrédulos, os mais quentes em uma geração de mornos, os mais visionários em uma geração de míopes. “Hereges” são aqueles que clamam quando todos querem se calar, que correm quando todos querem dormir, que voam quando todos se arrastam e que ainda sonham quando todos se recusam a crer. “Hereges” são os que pregam as 95 teses nas portas das velhas catedrais, os que desafiam velhos paradigmas, o que irritam “reis” e “aristocratas” que engordam às custas do status quo.

“Hereges” são aqueles que transformam em boas novas as coisas boas que já haviam ficado velhas. São os chamados “obstinados”, “insubmissos”, “rebeldes”, “subversivos” e “dissidentes”, cuja consciência não está cativa às expectativas alheias, mas somente às expectativas de Deus. “Hereges” são os de braço forte, cujos calos e músculos se desenvolvem no remar contra a maré.

“Hereges” são o que dão à luz aquilo de que antes somente se ouvia falar, os que trazem cor, forma, cheiro e vida ao que estava limitado ao papel e ao mundo das idéias.

Sem profecia o povo se corrompe, e não há um só profeta que não tenha sido “herege”.

© Pão & Vinho

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Recado aos amigos de Pão & Vinho

17 de junho de 2013

Aos amigos de P&V anuncio que o blog está no ar novamente. Como não escrevo regularmente há aproximadamente um ano, resolvi fechar as portas por mais de 40 dias, em reflexão, para saber se valia a pena manter o conteúdo no ar ou não, se era ou não de edificação para a Igreja brasileira.

Você reparará que não há nada de novo. Pensei até em mudar a aparência do site, mas com família, trabalho e faculdade, simplesmente não tenho tempo para estar adaptando e traduzindo novos temas para o português. Então resolvi manter esse mesmo.

A maioria dos artigos está disponível novamente. Somente quero esclarecer uma vez mais que apesar do “angry man” que aparece nos meus textos esporadicamente, definitivamente não jogo no time daqueles que têm “síndrome messiânica”, que demonizam as denominações e acham que somente eles possuem a “verdade”. Entendo que estamos passando por uma transição que envolve uma série de mudanças de paradigmas. Alguns irmãos permanecerão exatamente onde estão. Outros avançarão alguns marcos e manterão outros no lugar. E alguns outros alcançarão e viverão a plenitude da Reforma que Deus quer fazer na sua Casa.  Cada um que saiba discernir qual o seu chamado e seja recompensado segundo a sua fé.

Nenhum dos problemas da Igreja institucional me dá o direito de julgar a fé daqueles que a compõe. Mas o entendimento de que a Ekklesia se encontra também na Igreja institucional não me castra o senso crítico ou me tenta ao conformismo. Que fique claro, porém, que neste blog discuto problemas estruturais, não comportamentais – o que quer dizer não julgo pessoas, somente abordo a eficácia de métodos, tradições e crenças.

Ciente de que meus artigos foram usados no passado por pessoas de cujo espírito sectário não compartilho, pensei em exorcizar o “angry man” dos meus artigos. Mas isso se tornou extremante tedioso para mim. O que escrevi, escrevi. Por conta de meu estilo franco e direto, tenho poucos amigos na rede, mas cheguei à conclusão de que essa é uma das formas autênticas em que me expresso e que, pelo menos no meu caso, veemência não equivale à ódio. Se você não sabe discernir a diferença entre discutir métodos e atacar pessoas, por favor não leia este blog e não use uma linha sequer escrita por mim para embasar sua ira “anti-denominacional”. Não estamos do mesmo lado. Se você é um irmão denominacional, estamos juntos em Cristo, mas se você também não consegue discernir a diferença entre discutir métodos e julgar pessoas, é melhor que tampouco leia meu blog, porque vai se sentir atacado e vai ficar ofendido.

Tenho a convicção de que estar em uma Igreja institucional é como dirigir um FIAT 147: você não se torna um mau vizinho por ter um, mas terá problemas em um futuro próximo, não por questões de caráter, mas por problemas de engenharia e estrutura  – independentemente da qualidade dos passageiros que o ocupam. Não defendo uma determinada eclesiologia em detrimento de outras, visto que a Bíblia não nos delineia a “eclesiologia correta”, somente defendo a premissa de que nossa eclesiologia deve ser “líquida”, moldando-se às necessidades da Igreja local (ao invés de a Igreja local moldar-se às nossas tradições pré-fabricadas) – razão pela qual deve ser revista periodicamente. Essa é a essência da mensagem que este blog comunica.

Assim, em paz com Deus e com minha consciência, volto a disponibilizar o conteúdo de P&V. Se você é novo aqui no P&V, ou se deseja entender melhor a sua visão, leia a série de artigos O que definirá uma Igreja Orgânica nos Próximos Anos – Partes 1, 2 e 3. Se de alguma maneira você se sentir desafiado por aquilo que este trabalho comunica, terei então cumprido meu propósito na blogosfera.

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A Plenitude dos Tempos

16 de junho de 2013

Globalização, revolução tecnológica, PAX ROMANA e um profundo sentimento de desilusão marcaram o contexto em que o Cristianismo nasceu. Qualquer semelhança com nossos dias atuais, não é mera coincidência.

Paulo escreveu às igrejas da Galácia que “vindo, porém, a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho” (Gl 4:4). Nesta expressão singular – a plenitude dos tempos – Paulo resumiu aqueles longos séculos da atividade soberana de Deus nas nações dos homens, atividade essa necessária na preparação do mundo para a vinda de Jesus, o Messias. É muito interessante que a inscrição colocada na cruz de Jesus tenha sido escrita em hebraico, latim e grego (Jo 19:20). E essas três culturas, mais do que qualquer outras, prepararam o solo para o abundante florescimento da videira messiânica no primeiro século.

Em primeiro lugar, os hebreus em sua dispersão levaram consigo, para todo lugar, o entendimento de um único e verdadeiro Deus – Jeová. Também, estava profundamente arraigada em seu entendimento a expectativa do Reino do Messias no fim dos tempos. O Messias era, na verdade, a esperança de Israel e a luz dos gentios!

Em segundo lugar, a cultura grega contribuiu com sua incomparável língua, falada em todo o mundo conhecido daquela época, inicialmente como meio de proclamação apostólica oral (kerygma) e, mais tarde, como meio de instrução apostólica escrita (didaquê). Também a decadência moral da cultura grega na sua exploração do melhor das habilidades humanas na arte e na literatura, na filosofia e na ciência, serviu apenas para provar a sabedoria do poeta Bonar: “Tudo o que a minha alma provou, deixou apenas um vazio deprimente.” O caminho estava claramente preparado para a declaração ousada do Evangelho: “Há somente Cristo: Ele é tudo em todos” (Cl 3:11).

Em terceiro lugar, a contribuição da cultura romana para a “plenitude dos tempos” consistiu na unificação de todo o império romano, até um conjunto desordenado de nações herdado dos gregos. Através de sua rede de transporte, seu sistema de comunicações e correios, através de sua cultura, leis e governo militar, Roma consolidou e misturou a ‘farinha” de toda a massa da humanidade para que pudesse ser mais facilmente “levedada” pelo Evangelho de Cristo. Jesus realmente nasceu na plenitude dos tempos. Um mundo decadente e falido estava então realmente preparado para ouvir a declaração ungida do Senhorio sublime de Cristo dos lábios daquele pequeno grupo de homens que Jesus pessoalmente discipulou e depois enviou por todo o mundo como porta-vozes de sua redenção universal.

Fonte:

Schmitt, Charles P., “Raiz em uma Terra Seca”, Uma Nova Visão da História da Igreja. Impacto Publicações.

Devolvendo a "sacolinha" aos pobres

21 de julho de 2012

THE CHRISTIAN POST – Somente passar a sacolinha durante os cultos de domingo para cumprir o orçamento não era suficientente para os líderes de uma pequena igreja no estado do Mississippi.

Então, dois anos atrás, o pastor e os líderes da Igreja Batista Traceway na cidade de Clinton começaram a orar sobre a melhor forma de servir a sua comunidade. Após dois meses de oração e jejum, eles ouviram de Deus que deveriam dar todos os dízimos e ofertas alçados pela igreja e doar aos pobres por todo um ano.

“No final de 2009, nossa liderança estava orando para saber qual a melhor maneira de representar Jesus Cristo em nossa comunidade. Essencialmente, nossa oração era: Deus, o que podemos fazer para que quando as pessoas olhem para nós elas vejam a Ti?” Explicou o Pastor da igreja, John Richardson, em entrevista ao The Christian Post.

“Quanto mais oravamos mais sentiamos Deus nos dizendo: “Se vocês querem me apresentar para a sociedade tornem-se generosos, porque Eu Sou generoso”, explicou Richardson. “A forma como nós interpretamos que poderiamos realizar a vontade de Deus foi em doar todos os nossos dízimos e ofertas aos mais carentes por um ano.”

Apenas 50 pessoas, muitas delas de natureza transitória, freqüentam regularmente Igreja Batista Traceway fundada seis anos atrás. No entanto, de Abril de 2010 a Abril de 2011, a igreja foi capaz de doar US $ 60.000 para pessoas carentes na comunidade – disse Richardson que relatou sua experiência na generosidade em um livro chamado Giving Away the Collection Plate (Doando a Sacolinha), lançado em Junho de 2012.

“Tudo o que era depositado no ofertório era doado para as mães que haviam sido abusadas por seus parceiros, que passavam por situações difícieis – que praticamente viviam somente com as roupas do corpo, pessoas que tentando se libertar de vícios, ou que perderam seus empregos, aos que enfrentam despejos por não poderem pagarem suas hipotecas, indivíduos com altas dívidas  de tratamento médico, etc “, explica o Pastor Richardson.

Quando questionado sobre como a Igreja foi capaz de operar sem rendimentos provenientes de dízimos, Richardson disse: “Foi um processo interessante.”

“Quando os líderes da Traceway ainda buscavam entender como administrariam a visão que Deus  lhes havia dado, uma outra igreja nos procurou e disse que se sentiriam honrados se a Igreja Batista Traceway começasse a se reunir no outro prédio desta igreja que não estava  sendo utilizado. Nos ofereceram as instalações sem cobrar taxas de aluguel, água ou luz.”

“Nós também cortamos o que pudemos de nosso orçamento”, disse Richardson. “Pedimos a outros de fora de nossa comunidade que fizessem uma doação única e especial à Igreja. Não aconteceu do dia para a noite, mas ao longo de um ano, notavelmente Deus proveu para cada uma das necessidades orçamentarias da igreja” continuou Richardson.

O pastor explica que uma vez dado início ao projeto de generosidade da Igreja, os frutos se fizeram visíveis na Igreja e foram demonstrados por aqueles que foram abençoados financeiramente pela comunidade. A Igreja soube de um homem na cidade que havia passado por um ano extremamente difícil, em que sua esposa o deixou, marcado por muitas dificuldades financeiras e “uma coisa atrás da outra aconteceu.” Depois que o motor de sua velha minivan se fundiu enquanto ele a dirigia, a Igreja “começou a caminhar com ele [em sua jornada espiritual] e acabou comprando-lhe uma picape em ótimas condições,” disse Richardson. Mais tarde, este homem, hoje um membro ativo da Igreja, contou-lhe como ele deu seu testemunho a um mendigo que se encontrava do lado de fora de um restaurante de fast food.

“Josh foi guiado por Deus a abordar este mendigo. Ele é uma pessoa introvertida, mas naquele dia se levantou de sua mesa, conversou com o mendigo por um minuto, trouxe-o para dentro e o fez sentar-se à uma mesa. Ele não somente lhe ofereceu uma refeição, mas sua dignidade também. Essa é a coisa. Somos generosos porque Deus foi generoso conosco e outros seguem seu exemplo. Foi maravilhoso ver como as pessoas começaram a crescer na fé porque estavam praticando a generosidade e se aperfeiçoando na sua imitação de Deus.”

Richard relata alguns pontos marcantes deste projeto:

“Quando você realmente começar a viver generosamente, especialmente se você sabe que é algo que Deus lhe pediu para fazer, isso abre seus olhos para o quão incrivelmente generoso Deus é para nós”, disse ele.

“A generosidade não é apenas uma boa coisa a se fazer. É provavelmente, a resposta para o maior obstáculo espiritual que temos hoje para nos tornar discípulos. A generosidade ao próximo carente é um antídoto para a ganância. A generosidade ajuda você a imitar os caminhos de Deus e tornar-se mais como Ele. É um pedaço enorme do processo de discipulado que a maioria das igrejas perdeu.”

O livro de Richardson é destinado a ajudar igrejas e cristãos a pensar mais sobre ser generosos. “Trata-se de levar os líderes de igrejas a um lugar onde comecem a olhar para o dinheiro e se perguntarem: Estou vivendo como se esse dinheiro pertencesse a Deus ou pertencesse a mim?”

Fonte: The Christian Post via Púlpito Cristão. Tradução de Wesley Moreira, revisão de @paoevinho.

Espero que outros possam se inspirar neste belo exemplo, que foi um projeto de um ano, e torná-lo um estilo de vida permanente de suas comunidade. A generosidade sacrificial está no cerne da reforma que Deus quer operar em nossa geração. Sem tocar nas finanças da Igreja, qualquer mundaça será superficial. Recomendo a leitura do texto “Falta-te uma coisa …“. (P&V)

Como foi formado o Antigo Testamento?

14 de julho de 2012

Quando Paulo fala que toda Escritura é inspirada, a qual parte do Velho Testamento ele se referia? Os livros da Lei? Os Profetas? Pois os diversos grupos religiosos Judeus aceitavam diferentes escrituras: havia os que aceitavam somente a Lei (Pentateuco); outros a Lei e os Profetas; outros consideravam os livros históricos e poéticos, mas não necessariamente os afirmavam ser soprados por Deus. Há ainda os escritos apócrifos, o que dizer deles? Se você fala que toda as Escrituras são sopradas por Deus, seriam estas as da Bíblia da tradição evangélica (ou seja, os 66 livros) ou os da tradição católica (73 livros)?

Caro leitor,

Os dois principais grupos religiosos dos tempos de Jesus eram os saduceus e os fariseus. Os saduceus não criam na ressureição e somente consideravam o Pentateuco inspirado, enquanto os fariseus criam na ressureição, e criam na inspiração da Lei (Pentateuco), dos Salmos (livros poéticos) e dos profetas. Jesus se alinhava doutrinariamente com os fariseus, pois pregava a ressurreição e fez repetidas citações da Lei, dos Salmos e dos profetas.

Em suas palavras finais, antes de sua ascenção aos Céus, o próprio Jesus confirmou a inspiração destas Escrituras quando disse:

São estas as palavras que vos disse estando ainda convosco: Que convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos profetas e nos Salmos. (Lucas 24:44 – grifos acrescentados).

Portanto, Jesus testifica a respeito da inspiração da Lei, dos profetas e dos Salmos e somente o seu testemunho já encerraria esta questão. Mas há evidência histórica suficiente para que entendamos que o Canon judaico era um conjunto fechado de livros, bem definido na tradição hebraica desde os tempos de Malaquias. O historiador judeu Flavio Josefo, em sua obra “Contra Apion” (1:8), nos informa que

… nós [os judeus] não temos uma multidão de livros entre nós, discordando e contradizendo-se mutualmente (como os gregos), mas temos somente vinte e dois livros … cinco deles escritos por Moisés, que contém suas leis … e desde a morte de Moisés até o reinado de Artaxerxes, Rei da Pérsia, que reinou depois de Xerxes, os profetas que vieram depois de Moisés registraram todos os feitos de seus tempos em treze livros. E os quatro livros restantes contém hinos dedicados a Deus, e preceitos de vida.

Portanto, Josefo esclarece que os livros considerados inspirados pela comunidade judaica foram produzidos em um período aproximado de mil anos que compreende os tempos de Moisés (1400 a.C.) até os tempos do fim do cativeiro babilônico (440 a.C). Esdras, Neemias, Ester, Ageu, Zacarias e Malaquias foram os últimos escritos produzidos nesta época que marcou o fim da atividade profética em Israel. Assim, depois de Malaquias, nenhum outro escrito possuiu a mesma autoridade que os demais, como esclarece o historiador judeu:

… desde os tempos de Artaxerxes nossa história vem sendo escrita de forma detalhada, mas não é considerada por nossos antepassados como tendo a mesma autoridade que os escritos anteriores, por que não há sucessão profética desde estes tempos.

Os manuscritos apócrifos – Tobias, Judite, I e II Macabeus, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico, Baruque e adições nos livros de Ester e Daniel (a História de Susana e de Bel e o dragão) – foram produzidos de dois a três séculos após este período, e somente foram misturados ao Cânon judaico quando foram traduzidos para o grego juntamente com os manuscritos sagrados, para a composição da versão grega da Bíblia conhecida como Septuaginta, ou LXX (séculos III – II a.C.).

O número de livros do Canon judeu (22) citado por Josefo difere dos atuais 39 livros do Antigo Testamento porque a contagem dos livros na época era diferente. Livros que em nossas Bíblias estão separados eram muitas vezes escritos em somente um pergaminho. O Talmude e a versão de Áquila das Escrituras (tradução grega pós Septuaginta, popular entre os judeus que se opunham à LXX), sugerem a divisão dos livros do Antigo Testamento como veremos abaixo:

Os “cinco de Moisés”:
1) Gênesis
2) Êxodo
3) Levítico
4) Números
5) Deuteronômio

Os “treze livros proféticos”:
6) Josué
7) Juízes + Rute
8 ) Samuel e Reis
9) Crônicas
10) Isaías
11) Jeremias
12) Lamentações
13) Ezequiel
14) O Livro dos 12 (Profetas menores: Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageus, Zacarias e Malaquias)
15) Jó
16) Ester
17) Daniel
18 ) Esdras + Neemias

Os quatro de livros de hinos e preceitos:
19) Salmos
20) Provérbios
21) Cânticos
22) Eclesiastes

Estes são os atuais livros da Tanack, a Bíblia judaica – a qual os reformadores protestantes tomaram como modelo, pois aos judeus foram confiados os oráculos de Deus (Romanos 3:1-2). De acordo com a Enciclopédia Judaica, a única discrepância entre a contagem de Josefo e a de alguns rabinos é que estes contavam o número de pergaminhos como 24, ao separar Samuel de Reis e Esdras de Neemias. Entretanto, os livros apócrifos nunca foram considerados pela comunidade judaica como inpirados, sendo conhecidos pelos judeus como obras culturais e folclóricas somente. Ainda de acordo com a Enciclopédia Judaica, os rolos contendo os apócrifos não constavam nas bibliotecas do Templo e das Sinagogas, sendo chamados pelos judeus de sefarim ha-ḥizonim, ou seja, os livros de fora.

Portanto, tanto o testemunho de Jesus quanto a história corroboram a idéia de que quando Paulo atestou quanto à inspiração das Escrituras ele, sendo judeu, tinha um conjunto específico de livros veterotestamentários em mente.

© Pão & Vinho

Este texto está sob a licença de Creative Commons e pode ser republicado, parcialmente ou na íntegra, desde que o conteúdo não seja alterado e a fonte seja devidamente citada: http://paoevinho.org.